07 setembro 2009

AOS RECÉM CHEGADOS

Pensei no que lhe dizer
No que se anuncia-se ser
Sorte é muito fácil querer
Poder; coisa dos fracos que nunca se prezam perder.

As vezes a gente perde sim.
As vezes se perde também.
E disso, basta que nada importa.
Tem sempre um caminho de volta.

Recomeçar é outro caminho
Bem mais difícil, árduo, cheio de espinho
Quimera se alcança a alma que apanha
Não, não acho a vida estranha.

Estranhamento me causa a causa e nunca o efeito
Até no mais belo estar se nota um inócuo defeito
E só no defeito podemos por absoluto notar a nossa inequívoca e inerme qualidade de ser que nos diferencia no ver, crer ou querer.

O mundo se faz esquecer o quão seres-humanos somos.
Só não se esquece disso, por favor;
não é ciência exata.

GOTAS DE ORVALHO

gotas de orvalho

umideceram-se minhas pálpebras
mas foi sem frio
ou qualquer arrepio
minhas mãos continuam ávidas ao conforto
longe, insensato, ingrato
sem fato.

sinto cheiro da chuva
me escorre aos vãos
já não ando sozinho
deleito.

nunca pleiteio
o porvir?
mero anseio

hoje mesmo senti frio
mas foi logo que se mudou
mal sabia do seu estado

foi logo
que se mudou

IDADE MÉDIA

Passou a princesa ao meu lado, passo fino, coisa elegante, tinha nos olhos a clara e o brilho dos diamantes. Senti tristeza na pele. Senti clausura na alma. Perguntei, aonde vais??? Respondi, tenho tédio. Insisti, vais sozinha??? Entendi, itinerante. Ignorando a vestimenta, que se fazia luz reluzente, tive a sina do aventureiro, e a honra do vil amante. Deixei-a de lado, num canto, suspiro em lugar de um pranto, segui pleno e reticente, segui do meu lado, intermitente.

Passou o vizir ao meu lado, passo curto, sombrio, calado, tinha nas mãos uma adaga, e no peito uma cruz cravada. Senti fraqueza instantânea, eminente. Senti a morte do ser, que se vai mais que doente. Perguntei, aonde vais??? Respondi, tenho ódio. Insisti, vais sozinho??? Entendi, e quem mais cruzar meu caminho. Fechei os olhos de toda desgraça, que dominava o abutre e a caça, tive a graça de estar sozinho, e a crença do lugar do meu ninho. Segui-o até o portão, gritei pra chamar atenção, conclamei um alerta com a mão, segui do meu lado, são.

Passou o guerreiro ao meu lado, passo certo, destino pesado, carregava nos punhos sangria, alegria da festa, seu último dia. Senti o pesar dos lamentos, das grandes batalhas, esquecimentos. Senti a tortura das glórias, das decadências e das vitórias. Perguntei, aonde vais??? Respondi, vou além. Insisti, vais sozinho??? Entendi, eu e meu Deus que comigo venha, me tenha. Estufei-me em respeito, tive fé, exaltei. E depois de pagão me perdi, derramei. E de tudo que eu abençoei, se segui do meu lado??? Não sei.

Passou o carrasco ao meu lado, passo ignóbil, passo julgado, tinha na sombra o poente, esperança, porão cadente. Nada senti a não ser sentimento, nada falei, com seu consentimento. E sem tempo, e sem tento, lá se foi na penumbra, se perdeu na masmorra, encontrou coerência, de quem vê no machado, a derradeira clemência. Continuei do meu lado, parado.

Passou o Rei ao meu lado, passo presente, passo passado, baldrame de nobre, alicerce cansado. Senti o gosto do brinde, a esbórnia da vida, o vassalo e o trono, eu senti despedida. E da ponte caída, eu gritei perguntei, aonde vais meu senhor??? Respondi, meu senhor??? Insisti, vais sozinho??? Entendi, onde for vou também sou apenas um Rei, e você que é meu reino, e não sabe o que eu sei, e quer tudo que eu tenho, para um dia ser eu, pois saiba o que é meu, é o que tudo é seu, e o tudo que tudo que é seu, é muito mais que ser eu. Cai.

Passou o meu pai ao meu lado, tinha nos livros saudade, e na idade o conhecimento, nos erros maturidade, a ingenuidade do esquecimento. Levantei-me, ergui-me, fiquei de pé, senti o cheiro das matas e do café, das invernadas e do rapé. Perguntei, já sou??? Respondi, já sei. Insisti, serei??? Entendi, já é. Dormi.

EXPERIMENTO



Experimento

De acaso incerto, aleatório preste, servil; talvez em vão, talvez não. Não sei nem quem és, nem possível conclusão. Quisera ocupar de antemão o lugar dado a um cristão??? Não quis e nem quererei, ostentar o pecado, do qual nada sei. Sou sem Deus, sou sem Rei, sigo apenas a ética, desta criatura hermética, que uma tal de genética, me falou que sou eu. Astuto. Perspicaz. Ateu. Dono de certo ideal, quem não tem isso ou quetal??? Se é a vida que nos aquece, a ciência rejuvenesce. E aos que fazem da reza uma prece, em busca insensata do melhor dia, pesco palavras, prezo pessoas, prezo alegria. Faço em verso, prosa e poesia. Escrevo à noite o brinde da serventia. Escrevo ao vento que anuncia o mais novo invento. Escrevo ao momento, todo e qualquer sentimento. Este assim é, meu experimento. Não se anuncia, vem sem aviso, e se alcança um sorriso, se vale o improviso. De acaso incerto, aleatório preste, servil; talvez em vão, talvez não.